Fantasma do porto de Santos perturba Temer

Nove das 82 perguntas enviadas pela Polícia Federal ao presidente Michel Temer que tratavam sobre seu relacionamento com empresas que operam no Porto de Santos, fazem referência a uma investigação iniciada por ela há mais de 15 anos, mas que terminou sendo arquivada pelo Supremo Tribunal Federal a pedido da Procuradoria-Geral da República.

 

No início dos anos 2000, a PF instaurou inquérito para apurar a ocorrência de supostos pagamentos de propinas ao então presidente da Câmara, Michel Temer, e ao presidente da Companhia de Docas de São Paulo (Codesp) na ocasião, Marcelo de Azeredo. O processo, na parte que investigava a prática do crime de corrupção supostamente praticado por Temer, foi arquivado em 2011.

 

“Se o inquérito tivesse seguido adiante, nós já poderíamos estar vivendo um outro capítulo da nossa história política. Muito do que a Lava Jato está desvendando hoje já estava insinuado na investigação que fiz”, afirmou ao Estado o delegado da Polícia Federal responsável pelo caso, Cássio Nogueira.

 

“Esse é um inquérito fantasma. Mesmo depois de muito tempo, ele volta para assombrar os envolvidos. Acho que pode servir de base para novas investigações”, disse o delegado, hoje com 52 anos e aposentado. “O relevante para mim é que nós estamos falando dos mesmos personagens e do mesmo modus operandi, que fazem as mesmas coisas, do mesmo jeito há anos”, afirmou.

 

Entre as perguntas encaminhadas na segunda-feira passada ao presidente, a PF quis saber qual é a relação de Temer com o empresário Antônio Celso Grecco, proprietário do Grupo Rodrimar e outras empresas que atuam no Porto de Santos. Os investigadores também questionaram sobre a proximidade entre ele e o coronel PM aposentado João Baptista Lima Filho, proprietário da Argeplan Arquitetura e Engenharia.

 

Na sexta-feira, a defesa de Temer encaminhou ofício ao ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato e responsável pelo inquérito que investiga o presidente no STF, no qual afirma que não iria responder às perguntas. O argumento é de que a PF foi tendenciosa e extrapolou o objeto das investigações – a suposta atuação de Temer em favor da JBS.

 

Essas ligações já foram investigadas no inquérito presidido por Nogueira, que tem origem inusitada: uma briga entre marido e mulher. Em um processo de reconhecimento de união estável em uma Vara de Família, datado de 1999, a então estudante de Psicologia Érica Santos acusou o ex-marido Marcelo de Azeredo e Temer de corrupção.

 

No processo, ela afirma que “o grosso” dos rendimentos de Azeredo era oriundo de “caixinhas” que empresas pagavam a ele para operar no porto. E que metade desses valores ilícitos era repassada ao “padrinho político” do presidente da Codesp, o então deputado Michel Temer.

 

Presidente nega relação com empresa investigada

 

A assessoria da Presidência da República afirmou, por e-mail, que é “absolutamente inverídica” a afirmação de que o presidente Michel Temer seria o destinatário de propinas supostamente pagas por empresas que atuam no Porto de Santos. “É absolutamente inverídica a versão de que propinas seriam destinadas ao presidente Michel Temer”, diz o texto.

 

Segundo a assessoria de imprensa, a relação entre Temer e a empresa Rodrimar e seu presidente, Antônio Celso Grecco, é “nenhuma”. Sobre a solicitação para prestar depoimento no inquérito presidido pelo delegado da PF Cássio Nogueira, a assessoria afirmou que Temer nunca recebeu ofício.

 

Questionada qual seria a influência do peemedebista no Porto de Santos, a assessoria do Planalto afirmou que, “em 2002, Michel Temer foi oposição ao governo PT e não tinha qualquer influência nem cargos no Executivo”.

 

A Rodrimar afirmou, também por e-mail, que as acusações de que teria pago “propinas” ou “caixinhas” são “totalmente inverídicas” e jamais foi investigada no inquérito. “As afirmações são totalmente infundadas no inquérito policial em questão, a empresa ou seus prepostos jamais fizeram parte da investigação nem sequer como testemunhas”.

 

O Estado procurou o coronel José Baptista de Lima Filho na sede da Argeplan, em São Paulo. No local, funcionários da empresa disseram que ele “não aparece” há pelo menos uma semana. Vizinhos e comerciantes dos arredores da companhia confirmaram a versão da “ausência” de Lima. Marcelo de Azeredo não foi localizado pela reportagem.

 

Questionada na quinta-feira se estava reabrindo investigação sobre supostos pagamentos de vantagens indevidas de empresas que atuam no Porto de Santos a pessoas ligadas a Temer, a Polícia Federal afirmou, por meio de sua assessoria, que não iria se manifestar sobre o assunto.