Os terminais graneleiros de Santos (SP) passarão a ser alvo de licenciamento ambiental por parte de Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb). Até hoje resguardados dessa obrigação, os operadores desses terminais – grandes tradings agrícolas, em geral – deverão ter a liberação ou renovação de licenças condicionadas a adequações que minimizem o impacto ambiental de suas operações com soja, milho e derivados no Porto de Santos, o maior do Brasil.
Uma reunião na Cetesb marcada para este mês definirá as diretrizes que serão aplicadas. O corpo técnico da agência defende a renovação da licença ambiental a cada quatro anos e um cronograma de dois a três anos para a implementação das “ações corretivas”, sob pena de interdição do terminal.
As empresas começarão a ser convocadas a partir de abril, de forma escalonada, tendo como critério quem acumula o maior número de penalidades ambientais. “Vamos olhar com olho grande para os terminais”, disse ao Valor Donald Magalhães, gerente do Departamento de Gestão Ambiental da Diretoria de Controle e Licenciamento Ambiental da Cetesb.
O cerco só se tornou possível com a publicação do decreto 8.437, de abril de 2015, que transferiu para o Estado a incumbência de fiscalizar terminais quando a movimentação da carga for inferior a 15 milhões de toneladas de grãos ao ano – em geral, um terminal escoa 6 milhões de toneladas. O mesmo critério serve para os terminais de uso privado (TUP).
No caso paulista, a nova determinação caiu como uma luva: o maior porto do país é também um baú de problemas ambientais e embates com a comunidade local, e a Cetesb se via de mãos amarradas para agir. “Até então, não podíamos ir além da advertência e penalidade”, diz Enedir Rodrigues, gerente da Cetesb em Santos. “E multa ambiental, ninguém paga”.
Desde 2008, a entidade realizou quase uma centena de advertências às empresas e aplicou o equivalente a R$ 3,7 milhões em multas -sem efeito. Faltava a ferramenta mais eficaz, segundo os fiscalizadores: a possibilidade real de interrupção das atividades portuárias.
As penalidades nos terminais graneleiros estão associadas a problemas de emissão de material particulado (poeira) e de odor fétido (do apodrecimento dos grãos de soja perdidos pelo caminho). Segundo o próprio governo federal, o maquinário velho e a falta de investimentos das empresas em instalações modernas colocam os terminais graneleiros brasileiros entre os mais sujos do mundo.
Nos últimos anos, as operações de tradings agrícolas em Santos transformaram-se em um conflito com moradores da Ponta da Praia, bairro próximo ao corredor de exportação de grãos, e a Prefeitura.
As reclamações constantes intensificaram as fiscalizações da Cetesb e culminaram em um marco no porto santista: a lacração de correias transportadoras da Caramuru, após 10 advertências e 10 multas em decorrência da poeira. Em plena safra de soja, a Caramuru voltou a operar sob liminar. “Não estamos parados, estamos fazendo ajustes desde vaporizadores nas moegas até ajustes nos carregadores de navios, que visam diminuir a poeira”, defendeu César Borges de Sousa, vice-presidente da empresa, que foi duas vezes a Santos desde a paralisação e participou de audiência pública com a população.
Outro marco veio do governo federal e forçou a multinacional ADM a anunciar investimentos de R$ 280 milhões para a readequação de seu terminal de grãos em Santos. E foi puxado, não à toa, pelo agronegócio.
“Os incidentes com açúcar em Santos [incêndios na esteira da Rumo e em armazém da Copersucar ], e depois combustível, elevaram a nossa atenção ao problema”, afirma Marcos Mia Porto, gerente de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). “Ou a gente tratava essa relação bem, ou a coisa ia esquentar com a comunidade”.
A Antaq procurou a Cetesb para entender melhor os problemas de Santos e, de forma inédita, atrelou cláusulas ambientais específicas à renovação antecipada pleiteada pela ADM para o seu terminal naquela porto. “Foi um divisor de águas”, diz Magalhães, da Cetesb.
Com o contrato renovado por mais 25 anos, a ADM entrará com a contrapartida de investir em equipamentos importados de “última geração”, como correias encapadas e shiploaders com sensores, e a construção de um novo armazém.
Os problemas de emissão de poeira e odor em Santos atingem todos os operadores do corredor de exportação de grãos do porto (veja foto acima) e foram ressaltados com o espraiamento da área residencial para as proximidades do cais. Com a fiscalização mais acirrada e o licenciamento ambiental em mãos, a Cetesb acredita que em alguns anos a população já notará a diferença na qualidade do ar – e voltará a sentir apenas a maresia.