Porto de Natal espera deslanchar, aos 80 anos

Construído para escoar açúcar na década de 30, o Porto de Natal completa 80 anos na próxima quarta-feira (24) com incremento  na movimentação de cargas e vários desafios. Um deles é viabilizar novas linhas de navegação. Atualmente, apenas uma armadora – a francesa CMA CGM – opera no Porto de Natal. O destino das mercadorias é a Europa. Quem precisa exportar para outros continentes, precisa buscar portos fora do Rio Grande do Norte.Este é o caso de Roberto Veiga, diretor de operações da Wobben WindPower, primeira empresa brasileira a fabricar turbinas eólicas de grande porte. A empresa realizou uma verdadeira operação de guerra para retirar os aerogeradores  do porto. Ruas chegaram a ser interditadas e postes retirados. Roberto pensou em transferir a base de Pecém para Natal, mas mudou de ideia. "Não há espaço nem linhas de navegação. Antes do porto é preciso ter navio", diz o executivo. "O sistema de saída do terminal é complicado e a área de estocagem  é pequena",  acrescenta. Segundo ele, trazer os equipamentos de navio baratearia o custo com transporte em pelo menos 30%. Hoje, parte dos produtos fabricados em Sorocaba chegam ao Rio Grande do Norte por carreta. "A falta de linhas atrapalha".
A empresa chegou a importar 60 toneladas em aerogeradores entre 2011 e 2012 por Natal. Apesar das limitações, o tempo de desembarque foi recorde, afirma Roberto.

Frutas

A localização do porto, no entanto, é um problema que não afeta apenas as empresas de energia. Os fruticultores também enfrentam dificuldades.

Atualmente, cerca de 70% do melão produzido no RN deixa a região Nordeste por portos do Ceará. O tráfego intenso no centro da cidade é apontado como uma das razões. "O porto de Natal está localizado no centro da cidade", justifica Francisco de Paula Segundo, presidente do Comitê Executivo de Fitossanidade (Coex), que representa fruticultores do RN e do Ceará, dois dos principais produtores no país. Várias soluções foram propostas para o Porto de Natal ao longo destes 80 anos. Ampliação da retro-área hoje ocupada pela comunidade do Maruim, construção de um novo cais na outra margem, e até a construção de um novo porto longe de Natal. Todas as propostas, segundo Pedro Terceiro de Melo, precisam ser criteriosamente analisadas.

Há muito tempo tenta-se viabilizar novas linhas. Segundo Pedro Terceiro de Melo, atual presidente da Codern, o projeto tem tudo para deslanchar agora. "Precisávamos primeiro capacitar a mão de obra e depois melhorar a infraestrutura. Já estamos fazendo isso". O porto passa por uma ampliação – a construção de mais um berço de atracação -, o que o credencia a receber navios maiores. Mas ainda há pedras no meio do caminho.

Uma delas é a falta de proteção nos pilares da ponte Newton Navarro, que limita a entrada de navios à noite e inutiliza o investimento atual, capaz de dobrar a capacidade de escoamento. A localização é outro problema apontado pelos especialistas. Falta retro-área e sobram ruas sinuosas no entorno.

'Novo porto' precisa de estudos de viabilidade

A ideia de construir um novo cais para o Porto de Natal na margem esquerda do Potengi, um dos projetos que poderiam viabilizar a movimentação de grandes volumes no terminal, chegou a ser apreciada pela presidenta Dilma Rousseff, por ocasião da apresentação do Plano Plurianual (PPA) 2012/2015, mas vetada por se tratar de um "empreendimento de grande porte, que não possui estudo prévio de viabilidade técnica, econômica, ambiental e social necessário à sua implementação". Segundo a presidência, aprovar obras nessas condições aumentaria 'significativamente' o risco de pulverização de recursos, de dilatação de prazos, de execução e de paralisação de obras.

Segundo o pré-projeto apresentado pela Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern) ainda em 2011, o equipamento demandaria um investimento aproximado de R$ 1,2 bilhão e ocuparia uma área de 8,5 quilômetros quadrados, em frente ao atual cais. "A margem esquerda do Potengi é a possibilidade mais viável, mais econômica e mais bem localizada. Nós sabemos disso. Mas entre saber e provar há uma diferença enorme. Por isso, vamos fazer um estudo de localização", chegou a dizer o diretor técnico da Codern, Hanna Safieh, em entrevista à TRIBUNA DO NORTE no início deste ano, sobre a decisão da presidenta.

Há controvérsias. "Conseguir uma licença para construir um cais na outra margem seria complicado. É uma área de mangue", afirma o economista William Pereira, doutor em Ciências Sociais, professor do departamento de Economia e coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Espaço, Trabalho, Inovação e Sustentabilidade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O procurador da República Fábio Nesi Venzon, do Ministério Público Federal, enviou um ofício à Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), em fevereiro deste ano, desautorizando a execução do projeto.

"A área é caracterizada como de preservação permanente, uma vez que se trata de manguezal e margem de rio, protegidos pelo Código Florestal", afirma o procurador. Venzon ressalta, no ofício, que a supressão de vegetação em área de preservação permanente só é autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio "e tão somente quando inexiste alternativa técnica e locacional". No caso da supressão de manguezal, a legislação, afirma o procurador, é ainda  mais restritiva, limitando-se à  utilidade pública.

Venzon destaca ainda que a conclusão quanto à ausência de alternativa locacional não pode partir apenas de um critério econômico. "É importante esclarecer  ainda que a área onde se pretende implantar o porto de Natal (o novo cais) é objeto de um Termo de Ajustamento de Conduta firmado, em junho de 2010, pelo Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual e IBAMA junto aos carcinicultores que ali se encontram instalados, destinado a recuperar aquele trecho do estuário, de forma a assegurar a regeneração do manguezal desmatado. No referido TAC foi acordada a recuperação imediata de 50% da área e fixado prazo de 5  anos para a recuperação dos 50% restantes. Após a conclusão da recuperação, há previsão de criação no local de uma unidade de conservação destinada à proteção do manguezal", finaliza.

Alternativas

Para o economista Aldemir Freire, do IBGE, construir um novo cais na margem esquerda do Potengi não seria a solução. "A dificuldade de acesso continuaria", justifica. Para o economista, a saída seria construir um novo porto no litoral norte. "O porto de Natal passaria a movimentar contêineres. O outro a movimentar granéis, como minério, por exemplo". Jean Paul Prates, ex-secretário estadual de Energia e presidente do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (Cerne) defende uma ideia parecida. A saída, segundo ele, seria construir um terminal oceânico de granéis e grandes cargas, fora da capital, através de uma parceria público-privada (com dinheiro público e privado).

Segundo Prates, o porto de Natal receberia cargas perecíveis e de alto valor agregado. Já o terminal oceânico receberia cargas de setores como mineração, eólica, petróleo e agroexportador. "A estabilidade do porto de Natal é uma de suas principais vantagens. Ele está localizado numa área protegida de correntes e por isso é ideal para recepcionar passageiros e movimentar cargas perecíveis, como frutas. Só não tem vocação para movimentar grandes cargas", diz ele.